6 de out. de 2020

merece uma crônica

 Merece uma crônica

Receberia a visita de uma amiga. Seria pela primeira vez. Amiga de poucas semanas e querida. Parece que nos afinamos na linguagem da Literatura, da Cultura. Muito a aprender. Trabalharíamos na organização dos Links do computador, projeto de edição de livros. Papo cabeça.
Passei pelo mercado, olhei os bolos, olhei...resolvi fazer eu mesma. Assim gosto de receber os amigos. Com minhas comidinhas. Havia tempo suficiente para fazê - lo.
Escolhi o de fubá. Receita feita “ milis” vezes, como diz minha amiga Lilian. Confiando na memória, me pus em avental e mãos à obra. A massa estava bonita. Escrevendo, senti o cheiro característico de massa queimando, não na assadeira, mas no chão do forno. Não deu outra. O bolo mais parecia um vulcão derramando suas lavas encandecidas. Era lindo de se ver, mesmo no desaponto de não servir o bolo. Desliguei o forno, vislumbrando o trabalhão que eu teria, para limpar tudo aquilo. Ficamos num beliscos de biscoito de polvilho e chá, enquanto trocávamos ideias. E são tantas.
Deixei o desapontamento acomodar em meu coração. Assim diz a poeta, mas a dona de casa ...rs
De manhã, não teve outro jeito - limpar. Poxa! Logo hoje que iria caminhar? Risos. E a crônica foi se tecendo.
--Olynda, há quanto tempo, diz a si mesma – preciso limpar este forno. Pronto! Chegou o dia. Ah, essa resiliência... nos faz mais serenos. Um outro olhar e agarramos a oportunidade, no caos.
Depois de muita lambança, forno acessível; resolvo verificar o teto. Puro bolo. Forro a parte limpa e mais um pouco de paciência. São as nossas precipitações. Vamos julgando, encerrando nossas conclusões, sem tempo para uma análise mais aprofundada, em vários ângulos. Poderia ter esfregado o teto primeiramente. A lógica seria de cima para baixo. Lei da gravidade. Não estava atenta.
Bom, já que... vamos remover o vidro também. Algumas marcas fincam - se com o tempo. Difíceis de serem removidas. Fiquei pensando nas mágoas, desamparos, desilusões, desamor não ditos. Sofridos, na solidão silenciosa, imposta por nós mesmos, até. Manchas vão anuviando nossos sentimentos, nosso encantamento nas coisas simples. O mundo fica obscuro, sem a transparência daqueles que vêm o mundo com a alma. Cicatrizes mal curadas enfeiam, amargam a vida. Lancei mão de vários produtos, até espátulas. Se não nos sentimos felizes, nunca, é preciso procurar outras ferramentas. Profissionais que possam nos abrir os olhos para outras margens, outro jeito de travessia. Seguir? Lavar a alma ? Depende de nós.
É possível. As marcas se foram, mesmo incrustadas pelo uso.
A remoção da sujeira exigiu força, determinação, escolhas, parada. E não é assim a vida?
Fogão limpo – crônica estruturada. Ela é o retrato dos nossos instantes vividos, no sentido de um olhar. Merecia parar tudo, por ela, por mim. Cronista que é cronista, não perde uma emoção.
Será que bato outro bolo?
Acho que darei um tempo. Procurando meu livro antigo de receitas. Momento de reflexão: Onde foi que eu errei?
Olynda Bassan
ABletras
A imagem pode conter: comida e área interna
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