21 de fev. de 2019

Nossos ninhos



                  Nossos ninhos

Toma-se consciência do ninho vazio quando se guarda as taças, a quantidade extra dos talheres, os colchões espalhados pela casa. Do que partiu. As Festas se findaram.
Neste ano, ao varrer o apartamento depois das despedidas, no silêncio dos ruídos, das vozes, fui construindo a crônica na emoção, nas sensações do ninho pleno, das chegadas, das malas preenchendo espaços vazios dos quartos entranhados de saudade. Dos filhos, netos, tios, sobrinhos que formaram elos de bênçãos e prazer infindo, na corrente chamada Família.
Eram grãos de areia que se juntavam, contando histórias de cá e de lá, trazidas pelas passadas de calçados com texturas, cores e numerações diferentes. O ponto convergente era a vontade de estarem juntos, na casa materna. Terras que se aproximam - família que se achega.
Nos poucos cabelos longos, curtos, macios, brancos espalhados pela casa, eu enxergava as 3 gerações que se penteavam para o encontro na sala, na festa, no bate- papo ao redor da mesa entre drinks e causos. O Natal em continuidade nos olhares, nos laços onde não se separam as fitas, no até breve. No fios, a individualidade, o DNA peculiar convivendo na harmonia da individuação, da resiliência. Como diz meu amigo escritor Paulino : “ A vida não é um mar de rosas, tem de tudo” Conviver no entendimento aproxima o humano ao divino, na espiritualidade do Ser. Na alma acariciada – a seta da paz do mundo.
Que delícia! Perfumes se misturavam no estilo de cada um. Suave como quem saiu do banho, requinte num “Chanel”, sensual num “Cavalera”, sedutor num “Armani”. Sentimos o aconchego, na pele do abraço gostoso que acalma, que nos diz o quanto somos queridos, que alinha amores e desamores no perdão. Quem não sonha com um abraço macio, cheiroso, como pétalas aveludadas de rosa?
A vida preenchia a casa, quando, da cozinha, exalavam os odores da refeição preparada com o carinho de quem ama mexendo nas panelas. As mãos são veios por onde escorrem o amor da alma, partilhada com família, com amigos. Acolher me dá o sentido do existir.
Para se experimentar a acolhida, desmancha - se a rotina, os hábitos, a estrutura dos quarto,as setas.. Veste-se o sapato de quem nos saúda, no trinco que se abre. Mesmo que seja para uma visita rápida, dos que moram bem ali. O que vale é a sua comodidade, seu bem – estar, sua sensação de ser amado, nos detalhes. Tenho até pratinhos e copos diferenciados para os pequenos. Netos em diferentes fases - cuidados singulares.
Há plenitude no ninho repleto de pássaros, de filhotes, ainda que sejam instantes. O momento do voo se aproxima - logo as malas voltam para o carro, abrem -se os espaços - uma última olhadela para constatar que não se esqueceram de nada. A irmã passa para se despedir e ama quando diz : avise quando chegar. " Aviso, irmã " Eles sempre se comunicam dizendo irmã, irmão. Acho lindo!
O olhar da mãe se alonga para não perder nenhum segundo do encontro, dos que moram longe ou dos filhos que estão por perto e dizem apenas tchau. E a concretude de tudo que escrevi sobre o ninho ocupado vem da frase da neta Valentine :
--Mamãe, não podemos ficar mais uns dias.?
“A alma só permanece onde se sente bem.” É isso?
Costurei esse ninho com fios de amor, de fé, de esperança, de força para que suportasse, não o peso, mas a essência de cada um; a alma que viesse com suas sombras e com suas luzes; as palavras ditas e as guardadas; o descanso da labuta da vida. Nele fui feliz, muito feliz nas asas que se abriram para aconchegar os rebentos. Em metamorfose, o ninho se esvazia e se faz lembrança, na minha imensa gratidão a Deus.
Olynda Bassan
Membro da ABletras

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